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A mostrar mensagens de 2014

Listas e mãos que fogem

Cheguei a casa e no momento em que pus a chave na porta percebi que não sou a mesma. Desde o momento em que fechei esta mesma porta umas horas antes, tudo mudou. Tudo é, talvez, um pouco exagerado. Mas alguma coisa em mim mudou. Sentei-me e tentei fazer uma lista do que tinha mudado - sabes como gosto de listas, listas de compras, de tarefas… Ainda sem pensar bem, a minha mão escreveu:                 - Gosto de ti. E isto não é algo que tenha mudado. Mas é algo que se mantém. E até nas mudanças, a continuidade é importante. E a lista continuou. Percebi que pela primeira vez em algum tempo voltei a sentir-me de alguém. Não no sentido sufocante de falta de liberdade, de pertença. Mas no sentido de ter alguém que toma conta de mim, alguém que num grupo de pessoas olha para mim e sorri. Alguém me que faz sentir mais eu no meio de uma multidão.                 - Mais minha.                 - Mais tua. E memórias. Sou pessoa de memórias. Sempre fui. Baús, fotogr

Não vale tudo

Não vale tudo. Há alturas em que não vale tudo. Não vale tudo no amor, nem na guerra. Nem na morte. Ou vale, se pensarmos que tudo pode (deve) ser esquecido e aí passa a valer tudo. Vale a palavra, vale o olhar, vale tudo o que foi proibido. Mas foi proibido. E deixou de valer. Quando se é proibido, tudo deixa de valer. Deixa de ter valor, portanto. E isso partiu-me. E partiu o que tínhamos. Sem palavras bonitas, és uma merda. Deixaste que uma amizade de meia vida desaparecesse por proibições. E não vale tudo. E mesmo que volte a valer, o valor foi-se. Muito dele, pelo menos. És uma merda, porque me obrigas a ser a melhor pessoa que sei e consigo ser. És uma merda porque não acreditaste no valor que havia e aceitaste proibições e agora forças-me a ser boa pessoa. E não mereces. Não mereces mesmo. E não vale tudo, ouviste? Não vale.

Coimbra de Inês.

Sinto saudades de Coimbra. Das noites bem passadas, do cheiro da rua depois da chuva. Dos encontros desajeitados de uma ponta para a outra da rua. Dos sonhos escritos num papel numa longa noite, e deixados nos paralelos de uma praça movimentada. Dos planos decididos a quente e a frio e a cores e a tons de cinzento. Das certezas convictas de quem sabia, ou parecia saber, que nada mudaria. Dos dias solarengos numa qualquer esplanada. Da frescura de uma cerveja acompanhada por dois dedos de conversa. Dos corredores mais sábios que nós próprios, de tantas histórias já ouvidas. Das promessas e juras de amor num qualquer jardim encantado. Sinto saudades de Coimbra por tudo aquilo que não é palpável, Por tudo aquilo que ficou para trás e jamais poderá ser revivido. Pelos tempos que eram de lutadores e sonhadores e seres destemidos. Pelos tempos em que, tentando ser tudo, éramos imortais.

Era

Ele era meu. O olhar dele era meu. Se a sala estivesse cheia de gente, mesmo que fosse a situação mais solene de toda a nossa vida, o olhar dele desviava-se para mim. E o sorriso que não conseguia evitar denunciava-nos. Ele era meu. E eu era inevitável e indubitavelmente dele. E aquele sorriso - ai aquele sorriso - era difícil de se mostrar. Menos comigo, dizia. Um pequeno piscar de olhos, um semi sorriso e toda a sala sabia que tinha deixado de existir. Fosse a situação mais frívola do mundo ou a mais solene. Quando os nossos olhares se encontravam não havia volta. Era um mundo novo. E quem estava ficava feliz por ter assistido a tal fenómeno. Eramos nós. Um nós tão nosso e tão de todos que raramente nos tocávamos sequer quando em público. Mas todos sabiam que eu trazia comigo um bocado daquele sorriso. E no momento em que eu entrava pela porta, ele olhava-me como se me olhasse pela primeira vez de novo. Como se, mesmo totalmente despenteada, eu fosse a mulher mais bonita

Fora do sítio pode ser arrumado

Não percebo porque é que tantos temem um 'gosto de ti' fora do sítio. Adiantado ou atrasado, um gosto de ti é um gosto de ti. É uma aprovação da tua pessoa. - Parabéns, trabalhaste o suficiente para te moldares e transformares em alguém agradável ao coração. Eu gosto de horas. De saber a quantas ando. Mas no que a gostos de ti diz respeito, acho que nunca acerto. E não acho que venha mal ao mundo por isso. No final de contas prefiro ficar com uma conta gigante de gostos de ti fora do sítio do que não ter nenhum.

Perspetivas de futuro

E o que mais me custa, no meio de tudo isto, é não saber se algum dia voltarei a sentir isto por outra pessoa. Não só custa. Assusta. O friozinho na barriga, a preocupação constante. E até a incapacidade de adormecer sem antes saber que o carro está estacionado e a cabeça está na almofada. É o não saber se vou conseguir voltar a largar tudo para estar com alguém, ou se existirá alguém capaz de me fazer não pensar. Acho que vamos concordar que vou ser sempre, para sempre, um bocadinho apaixonada por ele. Dirão outros que não haverá problema desde que isso não nos impeça de viver e continuar com as nossas vidas. Essa é a fase seguinte. Perceber que não há problema em largar um bocadinho a mão tão apertada, e que se ao largá-la, escorregar uns centímetros, também sobreviverei na mesma. É isso. Um dia vou perceber que não tem mal não voltar a sentir isto por outra pessoa. 'Isto' ficou reservado para esta pessoa. Outra pessoa terá direito a outra qualquer palavra. Amor

Eu por inteiro.

De repente deixei de escrever em metáforas. É sabido que escrever sempre me ajudou a processar e entender o turbilhão de sentimentos e emoções que nunca soube perceber natural e normalmente. E sempre usei metáforas, porque dizer nomes era difícil, e falar de sítios que eram tão demasiadamente meus era impensável. E, de repente, já não sei escrever com metáforas. Passei a ser a preto e branco? Ou cresci? Quer dizer, não preciso de crescer para deixar de usar metáforas. Ou não é preciso deixar de usar metáforas para crescer. Já não estou a fazer sentido e é mais ou menos isso que se passa. Ou então, de repente, tudo faz sentido. E eu é que me escondia nas metáforas e nas histórias com personagens inventadas, mas sentimentos verdadeiros. De repente já não há epidemias de moscas para mostrar o amor, nem uma cama que fala da minha pequenez em relação ao turbilhão de complexos pensamentos que voam pela cabeça de outros. De repente há um sonho, que já não é um sonho, mas que a

quando um e um não são dois

Hoje sinto-me só. Sozinha já é o meu novo normal. Mas sinto-me só.Será possível sentir-me a viver um sonho, sentir que devia estar radiante, que estou finalmente a fazer-me à vida, de malas e bagagens. E sonhos e acordares cedo? E será possível que esta visão de futuro, de realização de sonhos me pareça incompleta e com ela me faça sentir toda eu uma ínfima parte do que já fui? Falta a mão, a companhia, o segundo prato na mesa, o segundo copo de coca-cola, a mensagem de bom dia, a companhia para o comboio. Não devia funcionar assim. Não era suposto. Sempre soube os supostos e pressupostos e as consequências. E não era assim. Viver um sonho novo era suposto fazer esquecer o antigo, ou pelo menos torná-lo menos presente. Não acentuar a ausência do anterior, porque o sonho era o primeiro e o segundo, quando um e um são dois e as contas são perfeitas como a física que faz o mundo girar direitinho. E um mundo a girar direitinho era o sonho. O sonho era dois - não um primeiro mais u